segunda-feira, 27 de julho de 2009

"NÓIS MUDEMO"

Fidêncio Bogo


O ônibus da Transbrasiliana deslizava manso pela Belém-Brasília rumo a Porto Nacional. Era abril, mês das derradeiras chuvas. No céu, uma luazona enorme pra namorado nenhum botar defeito. Sob o luar generoso, o cerrado verdejante era um presépio, toda poesia e misticismo.
Mas minha alma estava profundamente amargurada.
O encontro daquela tarde, a visão daquele jovem marcado pelo sofrimento, precocemente envelhecido, a crua recordação de um episódio que parecia tão banal... Tentei dormir. Inútil. Meus olhos percorriam a paisagem enluarada, mas ela nada mais era para mim que o pano de fundo de um drama estúpido e trágico.
As aulas tinham começado numa segunda-feira. Escola de periferia, classes heterogêneas, retardatários. Entre eles, uma criança crescida, quase um rapaz.- Por que você faltou esses dias todos?- É que nóis mudemo onti, fessora. Nóis veio da fazenda. Risadinhas da turma.- Não se diz "nóis mudemo", menino! A gente deve dizer: nós mudamos, tá?-Tá, fessora!'
No recreio, as chacotas dos colegas: Oi, nóis mudemo! Até amanhã, nóis mudemo! No dia seguinte, a mesma coisa: risadinhas, cochichos, gozações.- Pai, não vô mais pra escola!- Oxente! Módi quê?Ouvida a história, o pai coçou a cabeça e disse:- Meu fio, num deixa a escola por uma bobagem dessa! Não liga pras gozações da mininada! Logo eles esquece.Não esqueceram.
Na quarta-feira, dei pela falta do menino. Ele não apareceu no resto da semana, nem na segunda-feira seguinte. Aí me dei conta de que eu nem sabia o nome dele. Procurei no diário de classe e soube que se chamava Lúcio - Lúcio Rodrigues Barbosa.
Achei o endereço. Longe, um dos últimos casebres do bairro. Fui lá, uma tarde. O rapazola tinha partido no dia anterior para a casa de um tio, no sul do Pará.- É, professora, meu fio não aguentou as gozação da mininada. Eu tentei fazê ele continua, mas não teve jeito. Ele tava chatiado demais. Bosta de vida! Eu devia di té ficado na fazenda côa famia. Na cidade nóis não tem veis. Nóis fala tudo errado.Inexperiente, confusa, sem saber o que dizer, engoli em seco e me despedi.O episódio ocorrera há dezessete anos e tinha caído em total esquecimento, ao menos de minha parte.
Uma tarde, num povoado à beira da Belém-Brasília, eu ia pegar o ônibus, quando alguém me chamou. Olhei e vi, acenando para mim, um rapaz pobremente vestido, magro, com aparência doentia.- O que é, moço?- A senhora não se lembra de mim, fessora?
Olhei para ele, dei tratos à bola. Reconstituí num momento meus longos anos de sacerdócio, digo, de magistério. Tudo escuro.- Não me lembro não, moço. Você me conhece? De onde? Foi meu aluno? Como se chama?Para tantas perguntas, uma resposta lacônica:- Eu sou "Nóis mudemo”, lembra?Comecei a tremer.- Sim, moço. Agora lembro, Como era mesmo seu nome?- Lúcio - Lúcio Rodrigues Barbosa.- O que aconteceu com você?- O que aconteceu ? Ah! fessora! É mais fácil dizê o que não aconteceu . Comi o pão que o diabo amasso. E êta diabo bom de padaria! Fui garimpeiro, fui bóia fria, um "gato" me arrecadou e levou num caminhão pruma fazenda no meio da mata. Lá trabaiei como escravo, passei fome, fui baleado quando consegui fugi. Peguei tudo quanto é doença. Até na cadeia já fui para. Nóis ignorante às veis fais coisa sem querê fazé. A escola fais uma farta danada. Eu não devia de té saído daquele jeito, fessora, mas não aguentei as gozação da turma. Eu vi logo que nunca ia consegui fala direito. Ainda hoje não sei.
Meu Deus!Aquela revelação me virou pelo avesso. Foi demais para mim. Descontrolada comecei a soluçar convulsivamente. Como eu podia ter sido tão burra e má? E abracei o rapaz, o que restava do rapaz, que me olhava atarantado.O ônibus buzinou com insistência.
O rapaz afastou-me de si suavemente.- Chora não, fessora! A senhora não tem curpa.
Como? Eu não tenho culpa? Deus do céu!Entrei no ônibus apinhado. Cem olhos eram cem flechas vingadoras apontadas para mim. O ônibus partiu. Pensei na minha sala de aula. Eu era uma assassina a caminho da guilhotina.Hoje tenho raiva da gramática. Eu mudo, tu mudas, ele muda, nós mudamos, mudamos, mudaamoos, mudaaamooos... Super usada, mal usada, abusada, ela é uma guilhotina dentro da escola. A gramática faz gato e sapato da língua materna - a língua que a criança aprendeu com seus pais e irmãos e colegas- e se torna o terror dos alunos. Em vez de estimular e fazer crescer, comunicando, ela reprime e oprime, cobrando centenas de regrinhas estúpidas para aquela idade.
E os lúcios da vida, os milhares de lúcios da periferia e do interior, barrados nas salas de aula: "Não é assim que se diz, menino!" Como se o professor quisesse dizer: "Você está errado! Os seu s pais estão errados! Seus irmãos e amigos e vizinhos estão errados! A certa sou eu! Imite-me! Copie-me! Fale como eu ! Você não seja você! Renegue suas raízes! Diminua-se! Desfigure-se! Fique no seu lugar! Seja uma sombra!" E siga desarmado para o matadouro.

Trabalho apresentado no II Congresso Científico da UniverCidade

DIÁLOGOS INTER/MULTICULTURAIS: ROMPENDO A BARREIRA DO SILÊNCIO
INTER/MULTICULTURAL DIALOGUES: BREAKING THE SILENCE BARRIER


Glória Regina Graçano Soares
Mestre em Educação (UFRJ).
UniverCidade – gloriagracano@yahoo.com.br



Palavras-chave: Cultura(s), diferença, multiculturalism.
Resumo: O presente trabalho analisa três artigos que discutem a problemática da pluralidade cultural, defendendo o olhar inter/multicultural como prioridade à formação docente. Destaca a polissemia do termo multiculturalismo e suas abordagens respectivas, salientando uma de suas vertentes mais críticas, chamada multiculturalismo crítico ou interculturalismo.

Key-words: Culture(s), difference, multiculturalism.
Abstract: The present study analyses three papers which discuss the problem of the cultural diversity, defending the inter/multicultural sight as a priority to the teacher’s education. It calls attention to the different meanings of the word multiculturalism and its respective sights, emphasizing one of its most critical versants, called critical multiculturalism or interculturalism.


A problemática cultural tem sido foco de intensos debates no mundo e, particularmente no Brasil, por ser um país construído por uma base multicultural muito forte.

Como conseqüência dessa diversidade cultural no âmbito escolar, presencia-se um processo de marginalização, quase que inconsciente, através do desconhecimento total dos professores acerca de padrões culturais que não coincidem com os da cultura dominante. O que ocorre é que as outras culturas são, simplesmente, deixadas à margem do ensino, como se não tivessem utilidade alguma para a aprendizagem do aluno.

O presente estudo vislumbra diversas formas de pensar em culturas alternativas, reconhecendo a diversidade, assim como permitindo que dentro de cada cultura haja a diferença. Este artigo discute a superação de dicotomias, através de um currículo que leve em conta a diversidade do povo brasileiro, e que desenvolva propostas nas quais a metodologia, a relação professor-aluno e todo o contexto sejam tratados de maneira articulada.

1- Diálogo Sobre a Diferença Cultural e Estratégias Pedagógicas


Moreira (2002) parte de uma pergunta para iniciar sua reflexão: “Como evitar, então, um novo apartheid, como evitar a separação das diferenças, como evitar o esfacelamento de projetos comuns?” (p.19).

A resposta por ele apresentada seria a promoção do diálogo, que permitisse uma aproximação entre os diferentes. Diálogo este que atentasse para a necessidade de trocas, apesar das dificuldades que envolvem a concretização no cotidiano escolar.

A partir daí, o autor tece considerações sobre multiculturalismo, diferença e diálogo em educação, buscando incorporar estas teorias ao campo de currículo na Brasil.
O diálogo pode incrementar a compreensão entre as diferenças, e muitos pesquisadores privilegiam a discussão entre currículo e multiculturalismo. Nessas pesquisas, três temáticas são abordadas: a diferença, as estratégias pedagógicas e o diálogo.

a) Foco na diferença

O fato que caracteriza os seres humanos é a diferença. Sendo assim, devemos buscar o entendimento da singularidade de cada cultura, para podermos compreender mais e melhor a humanidade.

O Brasil é um dos países com maior população negra e isso enfatiza a questão da multiculturalidade. Não podemos tratar a diferença como desigualdade, ou melhor, a diferença deve ser celebrada, enquanto a desigualdade combatida.

A teoria que todos somos iguais esconde uma série de discriminações e preconceitos, que acabam por oprimir certos grupos. Aliás, em momentos de crise a questão da diferença cultural é sublinhada como um grande problema para os grupos hegemônicos, quando certos interesses tendem a ser preservados. Sendo assim, a política pedagógica e curricular deve levar em conta essa diversidade, promovendo o respeito às diferenças.

b) Foco nas estratégias pedagógicas

Stoer e Cortesão (apud MOREIRA, 2002) vislumbram a necessidade do abandono de uma perspectiva monocultural, por eles chamada de daltonismo cultural, na prática pedagógica. Segundo esses autores,

(...) O professor daltônico cultural é o que não se mostra sensível à heterogeneidade, ao arco-íris de culturas que tem em mãos quando trabalha com seus alunos. Para esse professor, todos os estudantes são idênticos, com saberes e necessidades semelhantes, o que o exime de diferenciar o currículo e a relação pedagógica, que estabelece em sala de aula. (idem, p.25)
O professor deve aproveitar a diversidade de símbolos, significados e tantas manifestações presentes, não somente nas escolas, mas na sociedade como um todo. “(...) Se o currículo não se limita ao que acontece no interior da escola, é necessário se trabalhar com os alunos outras experiências, devendo-se mesmo sugerir que eles vivam outras experiências fora da escola” (idem, p.30). Entretanto, para que isso aconteça a formação docente deve se preocupar com o tratamento da diversidade.
O futuro docente deve receber uma orientação multicultural, que trabalha com múltiplas linguagens, levando-o a ser um professor reflexivo.

Ao considerar Ellsworth, Moreira (ibidem) destaca que os futuros professores devem se familiarizar com as reações imprevisíveis dos alunos ao currículo e trabalhar com esse recurso, que é de extrema importância. Trata-se, então, de renovar as práticas pedagógicas, que reconhecem “o quando falar, o poder do tom de voz, o quando e porque silenciar, o poder e o ritmo do uso das imagens, a metáfora, o humor, a ironia, a história (...)” (p.26).

Levando-se em conta essa teoria, a tarefa do educador se resume em enredo, histórias, que transformem o currículo em contextos possíveis para a aprendizagem.

c) Foco no diálogo

O diálogo é diretamente associado a uma postura multicultural, pois somente ele pode propiciar e mediar relações entre pessoas de diversas culturas.

Em uma relação pedagógica comunicativa o diálogo pode promover descobertas, democracia, autonomia e respeito. Assim, ele deve ser visto como um instrumento de mediação entre grupos heterogêneos, que pode levar a eliminação de barreiras entre as diferenças.

O diálogo, também, pode alterar crenças, atitudes e valores, excluindo diferenças que impeçam o entendimento e propiciando a compreensão em meio às diversidades.
Por fim, no que se refere ao diálogo e a diferença, a educação multicultural deve valorizar e reforçar as identidades dos grupos. “Não se trata só de comunicar ou de informações, trata-se de criar um contexto relacional, um contexto que permite justamente que sujeitos, a partir de referenciais diferentes, interajam, acolham-se e entendam-se” (ibidem, p.29).

Valorizar as diferenças é a tarefa do professor mediador, articulando desde interesses na escola até na sociedade, de uma forma mais ampla.



2- Conceituando Inter e Multiculturalismo

Candau (2002) utiliza dois autores americanos como referenciais para embasar sua teoria de educação inter e multicultural. São eles Peter Mclaren (2000) e James Banks (1999), que abordam o multiculturalismo a partir da realidade americana, que tem atravessado diversas tragédias ligadas às questões étnicas.
Mclaren (apud Candau, 2002) ancora-se na Pedagogia Crítica e trabalha com questões analisadas pela perspectiva pós-moderna. Ele enumera quatro tendências em relação ao multiculturalismo. São elas:

1ª- Multiculturalismo conservador – que defende a construção de uma cultura comum, assimilando a todos à ordem social dominante.
2ª- Multiculturalismo humanista liberal – que sugere igualdade intelectual entre diferentes etnias e grupos sociais, permitindo uma competição igualitária numa sociedade capitalista.
3ª- Multiculcuralismo liberal de esquerda – que enfatiza a diferença cultural e afirma que privilegiando a igualdade podemos “abafar diferenças culturais importantes entre elas, assim como as diferenças de gênero, classe social e sexualidade” (ibidem, p.131).
4ª- Multiculturalismo crítico- que privilegia a transformação das relações sociais, culturais e institucionais, recusando a ver a cultura como não-conflitiva. Nesta tendência o educador é visto como um agente revolucionário.

A última tendência, também denominada multiculturalismo revolucionário, é onde Mclaren se situa, por ser contextualizado a partir de um foco político transformador. Neste enfoque a cultura jamais pode ser entendida como harmoniosa ou consensual, pois, para ele, “as questões relativas à diferença são determinadas pelos processos históricos, pelas mentalidades e ideologias, pelas relações de poder e mobilizam processos políticos e sociais” (ibidem, p.132).

Banks analisa o fracasso escolar de alunos advindos de camadas sociais populares, e particularmente de grupos étnicos como os afro-descendentes. Para essa problemática ele analisa dois paradigmas: a privação cultural e a diferença cultural.

O primeiro paradigma parte do pressuposto que o fracasso escolar se dá por conta da cultura em que os alunos foram socializados, que não favoreceu experiências tão fundamentais para um melhor desempenho escolar. Os que defendem essa teoria consideram a cultura dos alunos, em sua origem, como sendo o maior problema. Então, por esse paradigma, considera-se a diversidade cultural, mas desvaloriza-se determinadas culturas, assim como suas especificidades. Isso acaba por reduzir “o papel da educação a uma função de compensação cultural que termina por negar a diferença” (ibidem, p.133).

Já o segundo paradigma, chamado diferença cultural, afirma que diferentes culturas possuem comportamentos diferentes, assim como linguagens, valores e estilos, que devem ser compreendidos na sua origem. Os defensores dessa teoria vão contra ao primeiro paradigma, já que, para eles, o que precisa ser mudado não é a cultura do aluno e sim a da escola. Na visão desse autor a cultura da escola é construída com base no modelo hegemônico, apresentando um caráter monocultural.

Banks afirma que a educação multicultural tende a realizar grandes mudanças no sistema educacional, que tem por objetivo favorecer nos alunos o desenvolvimento de habilidades, atitudes e conhecimentos necessários para interagir com sua cultura, assim como a cultura dominante e também com outras culturas. Nesse tipo de educação sugerida por Banks, a ênfase não está no ou, mas no e (grifo da autora, CANDAU, 2002).

Candau privilegia em sua pesquisa a abordagem intercultural, que é conceituada como um processo em contínua construção, desconstrução e reconstrução, nas relações sociais que estão presentes na sociedade. Para a autora,

O interculturalismo, ainda pouco trabalhado pela literatura brasileira, supõe a deliberada inter-relação entre diferentes grupos culturais. Neste sentido, situa-se em confronto com todas as visões diferencialistas que favorecem processo radicais de afirmação de identidades culturais específicas. Rompe com uma visão essencialista das culturas e das identidades culturais (2002, p.135).


Esta abordagem se aproxima muito da tendência do multiculturalismo crítico de Mclaren, pois não desvincula as questões da desigualdade e da diferença, que estão presentes em nossa realidade.

Garcia Canclini (1999) também é citado por se aprofundar nesse processo de hibridização cultural na América Latina. Para ele a diferença se manifesta na interlocução dos momentos que estamos em conflito ou quando buscamos alianças (apud CANDAU, 2002).

A educação intercultural aposta na relação entre diferentes grupos, étnicos e sociais, nunca fugindo de conflitos, mas enfrentando-os e favorecendo os processos de negociação cultural. Esta abordagem promove uma educação com diálogo onde as diferenças sejam dialeticamente integradas, orientando à construção de uma sociedade plural e democrática.


3- Possíveis Olhares

Canen & Canen (2005) articulam o multiculturalismo a campos de pesquisa na educação e outras área do conhecimento. Os autores ilustram potenciais da perspectiva multicultural, tanto nas ciências humanas como nas ciências chamadas “duras”, indicando um possível caminho de pesquisa a ser explorado neste campo.

Nesse trabalho o multiculturalismo é destacado com diversos significados. Em uma pesquisa britânica sobre cursos de formação de docentes, ditos multiculturais, observou-se que cada um compreendia diferentemente o termo. Para alguns seria a simples presença de raças e etnias plurais no corpo docente, enquanto para outros a realização de uma série de palestras sobre o assunto, ou ainda uma dimensão voltada à valorização da diversidade cultural e desafio a preconceitos.

Mas, para Canen & Canen, “pensar em multiculturalismo é, acima de tudo, pensar sobre identidades plurais que perfazem as sociedades e em respostas que garantam a representação e a valorização dessas identidades nos espaços sociais e organizacionais” (ibidem, p. 42). Os autores refinam o conceito de identidade sugerindo a visualização da mesma em três dimensões: individual, coletiva e institucional.

A identidade individual constitui-se da pluralidade de marcadores que perfazem a constituição de sujeitos, híbridos e plurais. A chamada identidade coletiva “refere-se a algum marco da identidade percebido como central na construção de sua história de vida e das relações desiguais e preconceituosas que a atingem” (ibidem, p.43). A identidade coletiva é um conjunto de marcadores que caracterizam um ambiente institucional, marcando tensões entre as identidades individuais plurais, as identidades coletivas e o projeto de instituição a se construir.

Assim, o refinamento do conceito de identidade amplia o olhar multicultural para as diversas áreas, também plurais, não somente no campo educacional, criando aproximações que venham a contribuir para a compreensão das instituições e seus sujeitos, onde haja valorização da pluralidade cultural, desafiando preconceitos.

Os autores Canen & Canen (ibidem) citam um estudo de caso em uma organização multicultural, onde três de seus diretores tinham nacionalidades distintas, assim como referenciais culturais: um brasileiro, um americano e um inglês. Os três destacaram que, apesar de valores culturais inúmeras vezes conflitantes, os desafios desta diversidade deveriam ser enfrentados de forma competente e sensível. Salientaram, também, a necessidade de uma educação gerencial que qualifique estudantes nessa área, a fim de desenvolverem uma compreensão cultural transformadora, que valorize a diversidade cultural.

Os dados levantados neste estudo de caso ilustram os desafios enfrentados pelas organizações a partir do olhar multicultural, vislumbrando um pensamento sobre as instituições educacionais e sobre um novo currículo a ser implantado. Parcerias entre diversidade forma propostas por Canen (apud CANEN & CANEN) a fim de ir além de um simples treinamento para a multiculturalidade, mas considerando uma educação multicultural, tendo a identidade como centro.

Os autores vislumbram um currículo sem fronteiras, onde o multiculturalismo não fique restrito às áreas humanas e sociais, mas também se desenvolvam em áreas ligadas à tecnologia e outras afins.


4- Considerações Finais

A interculturalidade deve fazer parte da relação entre grupos sociais e étnicos, enfrentando os conflitos advindos dessa relação e favorecendo o diálogo entre eles.

A questão multicultural ainda não é assumida como princípio orientador da formação docente, mas cabe esperar a busca de novas rotas na construção de novos currículos multiculturalmente orientados. O multiculturalismo tende a contribuir para uma visão de um projeto coletivo em que haja diálogo entre grupos diferentes. O professor deve encontrar, em sua sala de aula, portadores de necessidades educativas especiais, a criança de classe trabalhadora, o negro, o índio, e terá que atender a todos esses grupos. A formação e a requalificação dos educadores são talvez o problema decisivo, do qual depende o sucesso ou o fracasso da proposta multicultural.

Enfim, através deste estudo, pôde ser visto que, nos últimos anos, foi intensificada uma reação à homogeneização cultural. Assim, a luta por um sistema escolar justo inclui a abertura de espaços para que as culturas dos grupos excluídos do currículo escolar tenham condições de falar mais alto, valorizando e dando vez e voz às suas experiências, e possibilitando um diálogo entre diferentes culturas.

Sabendo das dificuldades envolvidas no diálogo, devemos estabelecer pontes entre as diferenças, em um engajamento comum, incessante, na construção da cultura, onde outras culturas sejam construídas. Uma educação comprometida com a democratização das relações sociais e raciais jamais poderá ignorar uma educação inter/multicultural e o reconhecimento do valor das diferentes culturas e do direito à diferença, buscando uma linguagem comum e normas que possam transitar entre diferentes culturas.

Como conclusão deste artigo sugere-se o diálogo consciente e crítico, onde seremos capazes de promover processos educacionais que articulem igualdade e diferença neste país.




5- Referências Bibliográficas

CANEN, Ana & CANEN, Alberto G. Rompendo Fronteiras Curriculares: o multiculturalismo na educação e outros campos do saber. Currículo sem Fronteiras, v.5, n.2, pp.40-49, Jul /Dez 2005. Disponível em: www.curriculosemfronteiras.org.br.

CANDAU, Vera Maria Ferrão. Sociedade, Cotidiano Escolar e Cultura(s): uma aproximação. Educação & Sociedade, ano XXIII, n.79, Agosto/2002. Disponível em: www.scielo.br

CORAZZA, Sandra. Que quer um currículo? Pesquisas pós-críticas em Educação. 3 ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2001

GABRIEL, Carmen Teresa. A Identidade (nacional) na berlinda: uma forma possível de entrar no debate em torno da educação intercultural. In: Cultura(s) e educação. Entre o crítico e o pós-crítico. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

GANDIM, Luís Armando & HYPOLITO, Álvaro Moreira. Dilemas do nosso tempo: globalização, multiculturalismo e conhecimento (entrevista com Boaventura de Sousa Santos). Currículo sem Fronteiras, v.3, n.2, pp.5-23, Jul/Dez 2003. Disponível em: www.curriculosemfronteiras.org.br.

MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa. Currículo, Diferença Cultural e Diálogo. Educação & Sociedade, ano XXIII, n. 79, Agosto/2002. Disponível em: www.scielo.br.